Da série: Leituras
Os desenhos animados eram outrora expoentes da fantasia contra o racionalismo.
Faziam justiça aos animais e às coisas eletrizadas pela sua técnica, pois,
embora os mutilando, lhes conferiam uma segunda vida.
Agora não fazem mais que
confirmar a vitória da razão tecnológica sobre a verdade. Há alguns 20 anos
apresentavam ações coerentes que só se resolviam nos últimos instantes no ritmo
desenfreado das seqüências finais. O seu desenvolvimento muito se assemelhava
ao velho esquema da slapstick comedy (comédia pastelão). Mas agora as relações de tempo foram deslocadas.
Desde a primeira seqüência do desenho animado é anunciado o motivo da ação, com base no qual,
durante o seu curso, possa exercitar‐se a destruição: no meio dos aplausos do
público, o protagonista é atirado por todas as partes como um trapo. Assim a
quantidade de divertimento converte‐se na qualidade da crueldade organizada. Os
autodesignados censores da indústria cinematográfica, ligados a esta por uma afinidade
eletiva, velam para que a duração do delito prolongado seja um espetáculo
divertido. A hilaridade trunca o prazer que poderia resultar, em aparência, da
visão do abraço, e transfere a satisfação para o dia do progrom.
Se os desenhos animados têm outro efeito
além de habituar os sentidos a um novo ritmo, é o de martelar em todos os
cérebros a antiga verdade de que o mau trato contínuo, o esfacelamento de toda
resistência individual, é a condição da vida nesta sociedade.
Pato Donald
mostra nos desenhos animados como os infelizes são espancados na realidade,
para que os espectadores se habituem com o procedimento.
(Theodor Adorno - Indústria Cultural e Sociedade - 5ª. Edição (pag 19-20) )
Tens toda a razão. Mas eu nunca tinha olhado para a violência dos desenhos animados com o objetivo da aculturação dos espectadores.
ResponderExcluirE o que achas da violência de histórias infantis, tal como a do Capuchinho Vermelho? Ou a do João Ratão, cozido e assado no caldeirão?
Beijo, minha querida amiga Lisa.